A formação histórica do partido social-democrata. - GCI-ICG (GRUPO COMUNISTA INTERNACIONALISTA)

Apresenta-se aqui uma seleção de trechos de um texto do GCI (Grupo Comunista Internacionalista) intitulado “Leninismo contra a revolução”(*) sobre a formação do partido socialdemocrata na sociedade capitalista. Além do conteúdo presente no texto, foi acrescentado uma série de “notas explicativas” com trechos complementares de alguns escritos de Marx que servem de apoio para corroborar as afirmações do GCI.

– (*) Texto completo disponível em: <https://libcom.org/library/o-leninismo-contra-revolu

%C3%A7%C3%A3o-gci-icg>.

Como dissemos em muitas ocasiões, a social-democracia não é, nem nunca foi, um partido proletário. É, isto sim, um partido da burguesia “para” o proletariado, ou seja: para enquadrar o proletariado (1).

Todo partido da burguesia tem como projeto social o desenvolvimento do capital, isto é, do trabalho [substância do valor que se valoriza, isto é, do Capital (daí o aumento da “produtividade do trabalho”)]. A única especificidade da social-democracia é dirigir-se particularmente à classe que tem interesse objetivo em destruir esta sociedade, declarando que tem o mesmo objetivo, mas, desde a sua origem, essa declaração nada mais é do que uma isca para cumprir melhor sua função de enquadrar os proletários e submetê-los ao trabalho, ao desenvolvimento do capital.

Consequentemente (e contrariamente ao comunismo), a social-democracia não se define nunca contra o capitalismo, mas por seu desenvolvimento, por seu progresso, e dentro deste, diz representar o “fator trabalho”. (…)

A social-democracia não representa, em nenhum caso, os interesses do proletariado contra o capitalismo, mas, como ela mesma diz, os interesses do trabalho no capitalismo. O engodo consiste em apresentar como sinônimo do conflito entre burgueses e proletários a dupla capital-trabalho e se definir como partidária do polo trabalho. Que lhe seja concedido este mérito: a social-democracia é o partido do trabalho. Esta confusão é habitual, inclusive em setores que se pretendem continuadores da esquerda comunista. Quem está em luta com o capital não é o trabalho, mas o trabalhador. E não enquanto trabalhador, mas enquanto ser humano. O trabalho não só não se contrapõe ao capital, como é a sua a sua essência (2). O trabalho é a própria matéria do capital se capitalizando. No antagonismo proletariado/burguesia, o trabalho, o máximo trabalho, está necessariamente do lado do capital contra o ser humano. Este, enquanto trabalhador, não se opõe ao capital, ao contrário, dá-lhe vida, renuncia à sua vida para afirmar a vida do ser que o vampiriza (3). O trabalhador, não vive como ser humano, renuncia à sua humanidade (4). Como trabalhador, ele não é a sua própria vida, mas a vida do capital, é capital se reproduzindo. Com efeito, o capital é também trabalho acumulado e, no processo de produção, subsume o trabalho vivo. Mais ainda: se, do ponto de vista do processo de trabalho, o trabalho aparece como o sujeito ativo, ao transformar os meios de trabalho; do ponto de vista do processo de valorização, é o trabalho morto que dirige o trabalho vivo. Por isso, toda apologia explícita do trabalho é apologia implícita do capital e apologia da subsunção do trabalho ao capital. Por isso, na sociedade mercantil generalizada, toda apologia aberta do trabalho é apologia encoberta da exploração de classes!

Notas explicativas:

1 – No “18 de Brumário de Luís Bonaparte”, Marx analisa a formação da social-democracia na França do século XIX e expõem suas características invariáveis:

Para enfrentar a burguesia coligada, formara-se uma coalizão de pequeno-burgueses e

trabalhadores, o chamado Partido Social-Democrata. Depois das jornadas de junho de 1848, os pequeno-burgueses não se sentiram recompensados à altura, viram os seus interesses materiais ameaçados e as garantias democráticas, que deveriam assegurar-lhes a validação desses interesses, contestadas pela contrarrevolução. Em consequência disso, eles se aproximaram dos trabalhadores. Em contrapartida, a sua representação parlamentar, a Montanha, que durante a ditadura dos republicanos burgueses havia sido posta de lado, reconquistou, na última metade de vida da

Assembleia Constituinte, mediante a luta contra Bonaparte e contra os ministros monarquistas, a popularidade perdida. Ela havia feito uma aliança com os líderes socialistas. Em fevereiro de 1849, foram celebrados banquetes de reconciliação. Um programa comum foi elaborado, comitês eleitorais comuns foram instituídos e candidatos comuns lançados. A ponta revolucionária das exigências sociais do proletariado foi quebrada e foi-lhe dado um viés democrático, as reivindicações democráticas da pequena-burguesia foram despidas da sua forma meramente política e a sua ponta socialista voltada para fora. Assim surgiu a social-democracia (MARX, 2011, pp. 62-63, grifos nossos).

O caráter peculiar da social-democracia se resumia aos seguintes termos: reivindicavam-se instituições republicanas democráticas, não como meio de suprimir dois extremos, o capital e o trabalho assalariado, mas como meio de atenuar a sua contradição e transformá-la em harmonia. Quaisquer que sejam as medidas propostas para alcançar esse propósito, por mais que ele seja tornado com concepções mais ou menos revolucionárias, o teor permanece o mesmo. Esse teor é a modificação da sociedade pela via democrática, desde que seja uma modificação dentro dos limites

da pequena-burguesia. Basta não cultivar a ideia estreita de que a pequena-burguesia tenha pretendido, por princípio, impor um interesse egoísta de classe. A social-democracia acredita, antes, que as condições específicas da sua libertação constituem as condições gerais, as únicas nas quais a sociedade moderna pode ser salva e a luta de classes evitada (MARX, 2011, p. 63, grifos nossos).

Por fim, em vez de conseguir um aporte de forças do proletariado, o partido democrata o havia contagiado com a sua própria debilidade, e, como costuma acontecer no caso de grandes feitos democratas, os líderes tiveram a satisfação de culpar o seu “povo” de deserção, e o povo teve a satisfação de culpar os seus líderes de fraude (MARX, 2011, p. 66, grifos nossos).

[Portanto,] por representar a pequena burguesia, ou seja, uma classe de transição, na qual os interesses de duas classes se embotam de uma só vez, o democrata tem a presunção de se encontrar acima de toda e qualquer contradição de classe. Os democratas admitem que o seu confronto é com uma classe privilegiada, mas pensam que eles é que constituem o povo junto com todo o entorno restante da nação, que eles representam o direito do povo, que o seu interesse é o interesse do povo (MARX, 2011, p. 67, grifos e acréscimo nossos).

[Referência: MARX, Karl. O 18 de brumário de Luís Bonaparte. São Paulo: Boitempo, 2011. (Coleção Marx-Engels).].

2 – “A essência subjetiva da propriedade privada, a propriedade enquanto atividade sendo para si, enquanto sujeito, enquanto pessoa, é o trabalho” (MARX, 2004, p. 99). “Mas o trabalho, a essência subjetiva da propriedade privada enquanto exclusão da propriedade, e o capital, o trabalho objetivo enquanto exclusão do trabalho, são a propriedade privada enquanto sua relação desenvolvida da contradição” (MARX, 2004, p. 103).

[Referência: MARX, Karl. Manuscritos Econômico-Filosóficos. Tradução de Jesus Ranieri. São

Paulo: Boitempo Editorial, 2004.].

3 – “O capital tem um único impulso vital, o impulso de valorizar-se, de criar mais-valia, de absorver com sua parte constante, os meios de produção, a maior massa possível de mais-trabalho. O capital é trabalho morto, que apenas se reanima, à maneira dos vampiros, chupando trabalho vivo e que vive tanto mais quanto mais trabalho vivo chupa. O tempo durante o qual o trabalhador trabalha é o tempo durante o qual o capitalista consome a força de trabalho que comprou. Se o trabalhador consome seu tempo disponível para si, então rouba ao capitalista” (MARX, 1996, p. 347).

[Referência: MARX, Karl. O Capital: crítica da economia política. São Paulo: Nova Cultural,1996.].

4 – “A produção [capitalista] produz o humano não somente como uma mercadoria, a mercadoria humana, o humano na determinação da mercadoria; ela o produz, nesta determinação respectiva, precisamente como um ser desumanizado (entmenchtes Wesen) tanto espiritual quanto corporalmente – imoralidade, deformação, embrutecimento de trabalhadores e capitalistas. Seu produto é a mercadoria consciente-de-si e auto-ativa, … a mercadoria humana” (MARX, 2004, pp.92-93).

[Referência: MARX, Karl. Manuscritos Econômico-Filosóficos. Tradução de Jesus Ranieri. São Paulo: Boitempo Editorial, 2004.].

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